quarta-feira, 1 de setembro de 2010

"Ditadura eleitoral" ou Mídia golpista?
por: Luciano Alvarenga - Sociólogo.


Democracia nunca foi o forte na América Latina, alias ditadura sempre foi a palavra de comando no continente. Mas já faz algum tempo que eleições e rodizio de poder vêm ocorrendo. A volta da democracia coincidiu com a ascensão do neoliberalismo e a idéia, agora esgotada, de que o mercado tudo resolve e que o Estado quanto menor e menos importante, melhor. Políticos pós ditaduras assumiram o poder e se transformaram em reprodutores aqui daquelas idéias neoliberais. A democracia neste contexto era conveniente por que endossava a cartilha de mercado a venda.

Entretanto, algumas décadas de neoliberalismo só fez aumentar a pobreza, a violência urbana, o trafico de drogas e o favelamento das cidades. Tais conseqüências sociais e econômicas, que se diga também nos paises centrais se fizeram sentir, ainda que de forma menos drásticas, acabaram por levar ao poder na América Latina muitos políticos do centro esquerda do espectro político. Hugo Chaves, Rafael Correa, Evo Morales, Lula, Fernando Lugo, Tabare Vazquez estão entre eles.

Depois dos desmandos políticos ditatoriais e a implantação acritica de modelos econômicos importados, a consolidação da democracia no continente tem acontecido mediante a universalização de políticas sociais, o acesso generalizado dos mais pobres a programas de renda mínima, e por conseqüência a eleição e reeleição de políticos com trajetória nas lutas sociais e políticas na América Latina.

A chegada da esquerda ao poder, a implantação de fortes políticas sociais somadas a regularidade eleitoral esvaziou o discurso dos políticos de direita, esvaziamento agravado com a crise financeira e ideológica acontecida nos Estados unidos em 2008. A consolidação eleitoral da esquerda e os ganhos sociais obtidos pela população vêm gerando na mídia tradicional e nos meios políticos conservadores forte reação. É parte desta reação a tentativa de vender a idéia de que reeleição - implantada em muitos paises, inclusive Brasil, pela própria direita ou partidos de centro - é na verdade expressão de uma espécie de caudilhismo ou ditadura que a mídia vem divulgando como "ditadura eleitoral". Quando Uribe presidente da Colômbia busca reeleição é vontade popular, quando Chaves da Venezuela o faz é ditadura eleitoral.

Quando a democracia era conveniente a implantação de políticas econômicas neoliberais que expropriava direitos e aumentava o fosso entre pobres e ricos, ela era propagandeada como a única alternativa para o desenvolvimento via mercado. Agora que o mercado salvador faz água e é questionado em todo lugar e por todo mundo minimamente sério, a mídia tradicional questiona os processos eleitorais e a legitimidade da população em dizer se pretende como quer e como agir diante de um vácuo ideológico que possibilita a emergência do Estado como elemento básico e necessário ao desenvolvimento social e econômico dos povos latino americanos.

Diga-se que ninguém esta propalando a morte do mercado, muito pelo contrario, por todo canto se entoa as vantagens e os ganhos de uma sociedade de livre mercado. O que esta em questão é o papel e a presença do Estado na construção de uma sociedade mais equilibrada e equânime. Mas o problema da mídia também não é exatamente o Estado e suas funções na sociedade, mas o fato de que seus representantes políticos e os homens que a representam junto aquele Estado foram apeados do poder. Estão sem discurso não possuem projeto alternativo a falência do neoliberalismo, e, portanto, estarão por algum tempo mais, sabe-se lá quanto tempo mais, fora do poder e impedidos de condicionar as forças e as riquezas nacionais de acordo com seus particulares interesses de classe. A mídia questiona a democracia dando-lhe nome de "ditadura eleitoral", por que impossibilitada de apresentar nomes e formular propostas que sejam hegemônicas.

A formação do G20 como fórum decisório da economia mundial, deslocando a importância do G7, retira do centro da cena os Estados Unidos e redefine a posição de países como o Brasil que, a partir de agora terão muito mais margem de manobra para pensarem autonomamente a forma para seu desenvolvimento. Autonomia, soberania e prerrogativa sobre seus próprios desígnios é coisa nova na região, ainda mais quando quem está no poder na maioria dos principais paises Latinos são governos de esquerda. Governos de esquerda e autonomia decisória é tudo que políticos conservadores e a mídia tradicional latino americana não suportam; e este é o pano de fundo de quase tudo o que está acontecendo no continente. A questão daqui para frente é avanço democrático ou retrocesso golpista.